domingo, dezembro 31, 2006

Última postagem do ano

# Oi, gente! 2006 está acabando e 2007 está chegando!! Pra arrematar esse ano com chave de ouro, um conto da Rita: "Fedja". Aproveitem!
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FEDJA
Por Rita Maria Felix da Silva

Trecho do Diário de Fedja:

# "Oi, diário, faz um tempão que não escrevo em você, né? Me desculpa! É que fiquei tão ocupada estudando para as provas do fim desse período. Prunstz! É tanta coisa, que acho que vou ficar doida! (Melhor isso do que fizeram com a Saraj, aquela mesmo. Não passou nas provas e os pais dela mandaram a coitada praquele internato em Vadejadab. Deuses! O mundo mais chato do universo. Eu ia morrer de tédio lá!).
# Tenho tanta novidade pra te contar! Deixa ver... Oh, estou apaixonada! É, você vai dizer: ‘de novo?!’ Tá bom, tá bom, admito, mas... Rulstrak!!! Eu tô na puberdade!
# Ah, dessa vez é diferente. O nome dele é André. Você vai falar ‘Vrujut!!! Que nome é esse?’ Sei, soa esquisito em nossa língua. Daqui a pouquinho explico porquê. Ele é tão lindo, tão fofo, divino, tão krisp. É perfeito! Nunca conheci um cara que mexesse assim comigo. Penso em André o tempo todo e sonho também! É o mais inteligente da escola, me entende de um jeito que só ele consegue e quando olha para mim... Ah, fico excitada! Ai, queria tanto transar com ele. Hi, hi, hi, pronto: falei! Achei que não tinha coragem de escrever isso. Fiz até um desenho da gente... Bem, você imagina o que a gente tava fazendo no desenho... Hi, hi, hi...
# O desenho ficou tão legal que a Majek, depois de rir um bocado, não quis me devolver. Sei lá, acho que ela é doente... (lembra da Majek, né? Aquela mesma que aprontou a maior vergonha do universo na festa no fim do período passado. Oh, Deuses! Pegaram ela e Amplifrit agarradinhos debaixo de uma mesa. Todo mundo sabe que Majek é uma safada, mas... Urgh! O Amplifrit é nojento! Zrast demais! Eu, nem doida, ia deixar aquele tipo me tocar). Olha, só contei sobre o André pra você e pra Majek. Ela pode ser até meio zansp, mas ainda é a melhor amiga que tenho.
# Falando do André... É, sei que você vai pensar assim ‘tem alguma coisa errada. Você nunca escreve em mim se não tiver alguma bronca pra contar.’ Que mentira, diário! Não te conto só broncas, quer dizer, nem sempre, talvez até quase sempre... Tá, tá, tem uma bronca, sim.
# Tem um problema com André. Um problemão. Quer dizer, mamãe, que deve ser a mãe mais bacana desse sistema solar, nem ela ia aceitar uma coisa assim. Acho que se soubesse sobre ele... Hum, mamãe ia voltar praquele médico que cuidou da cabeça dela quando teve um colapso depois da morte da vovó. Ai, Deuses! Vai ver ela ia ter até outro colapso!
# E papai, ih, esse aí acho que me matava. Sério, não tô exagerando, não é aquele lance de 'metaforicamente', da aula de Literatura, não! Ele me matava, de verdade. Quer dizer, papai não é gente ruim e sei que até se esforça por mim e mamãe... Acontece que ia ser pedir muito pra cabeça dele e, antes de começar a me bater, ia falar de ‘bestialismo’, ‘heresia’, ‘abominação’ e um monte de palavras difíceis que aprendeu com vovô. Acho que estou ficando doida, mesmo, mais até do que a Majek, porque, quando penso no André... Ah, eu enfrentava papai por ele! Viu? Eu tô ficando maluca. Não pode ter outra explicação. Pior que tem: tô apaixonada por ele (já escrevi isso, não foi?)
# E ele também gosta de mim. Se você pudesse ver o jeito como ele sempre arruma uma maneira de ficar perto de mim nas aulas. É tudo tão fronsni, do jeitinho daqueles livros românticos que mamãe ainda lê.
# Mas aí vem aquela coisinha lá no fundo da minha cabeça. Você vai dizer que é medo... Eu sei que a espécie de André já era pra tá extinta faz tempo (graças aos Deuses que não, porque ele é muito lindo!!!). Me contaram que nenhum outro mundo aceitou abrigar o povo dele e muita gente tá odiando nosso governo por causa disso. Tudo bem, sei que é errado gostar dele, que eu devia achar nojento, que a sociedade condena mesmo, que, quando eu morrer vou direto pro Abismo Escuro e Eterno... Etc, etc.
# Sei tudo isso, mas, sabe, não ligo? Engulo o medo e todo dia fico olhando, assim, encantada pro André, só rezando pra gente poder fazer logo coisas mais interessantes do que só olhar...
# Marjad!!! Acho que os deuses não gostam de mim. Vai ver até me odeiam. Quer dizer, isso é maldade: por que eu tinha de me apaixonar, por que quando conheço o cara mais maravilhoso que existe, o amor da minha vida, ele tinha de ser humano?!"

FIM
Dedicado a Mayra Le Fey


Vocabulário de palavras do Povo Zanti (espécie de Fedja), utilizadas neste texto:

fronsni = gíria. Adjetivo. Muito romântico. Uma tradução possível seria “romântico meloso”.
krisp = gíria. Adjetivo. Inicialmente usado apenas para crianças pequenas, depois foi incorporado no vocabulário das jovens zantis para descrever homens muito bonitos de forma carinhosa. Equivalentes em nossa língua seriam “bonitinho”, “lindinho”, “fofinho”, etc.
Marjad = Substantivo. Imprecação. Na mitologia zanti, é o imperador dos espíritos inferiores que habitam o “Abismo Escuro e Eterno” (destino final daqueles que contrariam a religião e a tradição), responsáveis por atormentar os condenados. Aproximações em nossa cultura seriam “Diabo!”, “Diabos!”
prunstz = gíria. Substantivo. Palavrão. Embora usado largamente pelos jovens, seu uso é severamente desaconselhável em público, ocasiões formais e na presença de adultos. Originalmente era uma palavra comum utilizada pelos zantis para nomear o ato sexual. Com o tempo, o termo degenerou-se.
rulstrak = gíria. Substantivo. Palavrão. Igualmente utilizado apenas pelos mais jovens (seu uso por pessoas mais velhas é reprovável). Originalmente, era um termo pecuário e se referia ao animal que se desgarrou do rebanho. Em certo momento, começou a ser usado para filhos gerados fora do casamento, cuja mãe, uma amante, era nomeada pela sociedade como prostituta. Embora tido como ofensiva, a expressão não tem, entre os jovens zantis, essa conotação tão negativa. É usado mais como algo jocoso do que pejorativo.
vrujut = gíria. Interjeição de espanto. Aproximações para o Português poderiam ser “caramba!”, “minha nossa!”, “Meu Deus do Céu!”.
zansp = gíria. Adjetivo. Pessoa tida como muito estranha, louca.
zrast = gíria. Adjetivo. Coisa que se deve evitar ou pela qual se tem repugnância. Quando usado para uma pessoa, é um termo severamente ofensivo. A palavra tem origem na religião zanti e, em sua forma inicial, se referia a hábitos e atitudes dos quais se deveria manter-se distância.

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Drácula - o livro

# Dia 11 vai ser um dia decisivo pra mim. Logo depois das doces comemorações de aniversário, vou ter que botar o pé na estrada pra fazer a temidíssima prova de (A)Fundamentos de Mecânica. Tenho que passar a todo custo! Mas como não dá pra estudar Física o dia inteiro sem o cérebro fundir, enquanto eu descansava, carreguei umas pedras e me aventurei a fazer algo que eu já queria há muito tempo: uma análise do livro "Drácula" do Bram Stoker. Já li o livro tem quase um ano e meio, o que me despertou a lembrança de escrever a análise foi um e-mail do Pete que falava que a Desfolhar ia falar sobre literatura inglesa no próximo número.
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Análise de “Drácula”
# O Drácula é uma das figuras mais famosas dos filmes de terror. O cinema já o retratou de várias formas, sendo a mais conhecida a imagem do ator Bela Lugosi com sua capa ondulante, seu cabelo emplastado de brilhantina e seu olhar frio e superior. Porém, quando alguém pega o livro “Drácula” de Bram Stoker, o que se percebe é que a história do conde vampiro é bem diferente da maioria das adaptações cinematográficas que o livro recebeu.
# Para começar, “Drácula” não é uma história propriamente de terror, com o fito de assustar a pessoa e fazê-la perder o sono à noite. Longe disso. É uma história que pretende passar um pouco de esperança a quem lê. Se no fim do livro houvesse uma “moral da história”, como nas fábulas, essa moral seria: não importa o quanto o Mal parece poderoso e imponente e o quanto o Bem pareça fraco: desde que haja trabalho árduo e perseverança, o Bem sempre acabará vencendo.
# Outra coisa é que, antes de ser uma história de monstros e castelos mal-assombrados, “Drácula” é uma espécie de alegoria de luta do Bem contra o Mal. Não dá para dizer se isso era a intenção consciente de Stoker ao escrever o livro, mas a verdade é que mesmo matizes dessa luta estão presentes na história.
# Ao analisar o livro, achei que seria melhor fazer isso pelos personagens, acrescentando ocasionalmente alguma fala deles, numa tentativa de explicitar melhor o papel de cada um deles na alegoria já citada. A análise contém alguns spoilers, mas a verdade é que a história de Drácula já foi tão exaustivamente recontada, que várias surpresas, várias situações de suspense que o autor cria, já nos parecem velhos clichês, a despeito da sensação que devem ter feito na época de lançamento do livro. Cada um fica livre para prosseguir ou parar e ler a obra primeiro.
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# Transilvânia: Antes de mais nada, é melhor fazer alguns breves comentários a respeito da região mais citada em contos de terror. A Transilvânia não é uma terra triste e desolada como alguns filmes costumam mostrar. É, na verdade, um lugar de belíssimas paisagens e altamente recomendável para turistas. A própria Mina Harker, ao se aproximar do clímax da história, comenta que, sob outras circunstâncias, seria um prazer viajar por uma região tão pitoresca e interessante. O verdadeiro motivo de ser a região escolhida para que a história de Drácula se desenrole é o fato de ser uma área dominada pela superstição.
No século XIX, quando “Drácula” foi escrito, a Europa passava por uma efervescência de racionalismo. Por isso, naquela época, superstição era sinônimo de ignorância. Temos aí nossa primeira alegoria da história: o Mal (no caso, o Drácula) se desenvolve e se torna poderoso em meio à ignorância, simbolizada pela Transilvânia.

# Igreja Católica: Na história, os símbolos sagrados da Igreja Católica exercem o poder de afastar os vampiros. É interessante observar que isso não quer dizer que o catolicismo seja a melhor de todas as religiões. Pode simplesmente significar que a religião como um todo, praticada com a mesma fé demonstrada pelo prof. Van Helsing, é o que há de mais poderoso para afastar o Mal da vida de uma pessoa.

# Drácula: O mais famoso personagem do livro não tem nada de sedutor ou solitário, como popularizado pelos filmes. Ele é uma criatura quase desumanizada, cujo objetivo é espalhar seus “filhos” sobre o mundo e reinar sobre eles. É bastante inteligente, sabe discursar de maneira elegante, possui vastas reservas de dinheiro, mas tem o que o prof. Van Helsing chama de “prodigiosa mente infantil”. Infantil porque não avaliava todas as possibilidades antes de agir. Além, é claro, de seus famosos poderes de transfiguração, sua força, seu domínio sobre os animais e fenômenos da natureza e sua eternidade e o fato de ser conde, ou seja, um nobre, com posição privilegiada em relação aos outros homens.
# Tudo isso leva a crer que Drácula nada mais é do que uma personificação do Mal: ele quer expandir seus domínios e, para isso, dispõe de amplos recursos, em todas as áreas (financeira, intelectual...) e é gentil e melífluo quando quer algo de uma pessoa, não hesitando em descartá-la quando ela não é mais necessária. Só que o Mal não é tão livre como o Bem (Drácula só pode entrar em algum lugar se for convidado, assim como o Mal só entra no coração de alguém se a pessoa permitir) e não possui uma visão muito vasta: ele vê apenas o presente e o “eu”. Por isso, é tão egoísta e cruel.

# Dia de São Jorge: Dia que, segundo a crença romena, todos os males do mundo estão livres para correr pelo mundo. É precisamente o dia em que Jonathan Harker vai para o Castelo Drácula, o que reforça o fato de que Drácula pode estar personificando o Mal como um todo.

# Professor Van Helsing: É a própria antítese do Conde Drácula. O professor é um homem idoso muito inteligente e crítico, que confessa ter sido um grande cético a respeito do tema “vampiros” até estar diante do caso da Srta. Westenra. Ele é tão gentil e respeitoso que é impossível levá-lo a mal. Representa a inteligência usada para o Bem e a mente aberta a novas idéias, por mais estranhas que essas idéias possam parecer. O venerável ancião é uma pessoa de resolução muito mais forte do que as suas palavras doces podem fazer parecer e não hesita diante de nada, nem mesmo diante da reprovação de um grande amigo, para levar sua tarefa ao fim. Nas palavras de Jonathan Harker, “Ele é o homem que nasceu para caçá-lo e desmascará-lo” (ao Conde Drácula).
# Em alguns momentos, vemos também o prof. Van Helsing fazendo uma dura crítica ao materialismo cego do século XIX. Nessa época, nota-se uma verdadeira epidemia de fenômenos inexplicados pela ciência, como as famosas mesas girantes, materializações, transes sonambúlicos... As explicações dadas à época (algumas ainda hoje repetidas) eram capengas e, muitas vezes, resumiam-se a uma obstinada negação que tais fenômenos de fato ocorressem. Em quase todas as vezes, o detrator em questão sequer conhecia a fundo o fenômeno que criticava. Sobre essas pessoas, o professor diz: “Ah! Essa é a grande lacuna da nossa ciência positiva, que continua eximindo-se e recusando a esclarecer todos esses inexplorados ângulos do saber. Ou então, quando pensa que os aborda, limita-se a dizer-nos que nada tem a explicar.” Essa advertência continua bastante atual, é preciso que se diga.

# Jonathan Harker: Um tranqüilo homem de negócios que vai à Transilvânia tratar de assuntos imobiliários com Drácula. Durante as provações que passa no Castelo, fica evidenciado que possui nervos de aço e uma mente fria e lúcida. Ele representa a coragem que surge nos momentos difíceis, mostra que a mais comum das pessoas (um agente imobiliário) pode se tornar um herói se necessário.

# Dr. John Seward: É o próprio retrato do homem comum. Ele é inteligente, mas não é um gênio. Tem bastante bom-senso e bastante senso comum, também. Ora acredita nas palavras de Van Helsing, ora capitula por ser uma idéia radicalmente nova. Apesar disso, uma vez que forma sua opinião, vai até o fim na empreitada.

# Lorde Godalming: o pobre Arthur é o noivo de Lucy e representa o poder e o dinheiro empregados por uma boa causa. Como diz Mina, “Do que ele [o dinheiro] não será capaz, se bem aplicado, e como se torna prejudicial quando dele se faz um uso indevido e vil.”

# Quincey Morris: Ele é a Coragem, com C maiúsculo, um homem que é quase um cavaleiro medieval, tanto em coragem como em fidalguia. Rodou o mundo participando de caçadas e todo o tipo de aventuras.

# Esses quatro homens, Jonathan, John, Arthur e Quincey, podem ser encarados como sendo as facetas do homem ideal. Jonathan é resoluto, corajoso e absolutamente dedicado a sua mulher. John é prudente e leal a toda prova. Arthur é um apaixonado e Quincey, o perfeito cavalheiro. Os quatro unem forças, no decorrer do livro, em torno da imagem da Mulher, primeiro presente em Lucy, depois em Mina. Em alguns momentos, a história pode soar a machismo: os homens não querem deixar Mina participar das confabulações contra Drácula, por acharem que as emoções dessa caçada serem muito forte para uma mulher. Mas o próprio Bram Stoker quebra essa crença, quando faz com que Mina se torne peça chave na busca pelo Conde.
# Prossigamos com a análise das duas personagens femininas.

# Lucy Westenra: Lucy é a própria encarnação na doçura e da pureza. É uma jovem muito sensível e recebe propostas de casamento de três homens: Dr. Seward, Quincey e Arthur, preferindo o último. Sua pureza, entretanto, é maculada pela mordida de Drácula (hum... pressinto uma explicação freudiana aí), que não descansa até matá-la e transformá-la em uma morta-viva, a despeito do trabalho dos três homens que a amavam mais o prof. Van Helsing para mantê-la viva.
# Aí está uma alegoria interessante. Lucy era uma garota pura e inocente até o Mal tocá-la. Enquanto estava viva, ela lutava com esse mal. Logo que morreu, o Mal a subjugou de vez, tornando-a uma criatura cruel e lasciva, por pouco não levando seu noivo pelo mesmo caminho. Isso pode ser encarado como um exemplo de “O homem nasce puro, a sociedade o corrompe” ou de “Deus cria todos os seres simples e ignorantes, mas, através de seu livre-arbítrio, eles podem optar em seguir o caminho do mal”.
# Quando o grupo de homens já citado finalmente espeta uma estaca em seu coração, o Mal a deixa e ela volta a ser pura aos olhos deles, embora portasse o que o Dr. Seward chamou de “os sulcos ali deixados pelo sofrimento e pela natural devastação. Estes, porém, nos eram muito caros, pois apenas revelavam a autenticidade de uma alma que tão bem conhecíamos.” Esses sulcos são a marca de quem se aventura pelo Mal, sofre, mas consegue recuperar sua bondade essencial. Mesmo que as marcas deixadas por esse mal permaneçam, elas são apenas o testemunho de que a alma conseguiu superar uma rude prova.

# Mina Harker (nèe Murray): Cá está. Mina é uma personagem maravilhosa. Ela é a Mulher, a imagem ideal do sexo feminino. Mesmo que os homens tentem mantê-la afastada da perseguição a Drácula, ela prossegue ajudando-os de sua forma. Tem muita percepção e sensibilidade, além de inteligência e capacidade de organização. É eficiente e não gosta de ficar inativa. Quando Drácula a “batiza” com seu sangue, assim como Lucy, ela percebe que foi tocada pelo Mal. Mas, ao contrário de Lucy, ela não se prostra. Permanece ajudando e acaba mesmo desenvolvendo um elo telepático com o Conde que se prova muito útil. Quando vem o clímax, embora ela seja a vítima mais desditosa da eventual falha da caçada, ela se preocupa mais com os perigos que Jonathan corre ao se expor aos perigos e não cessa de agradecer a Deus por ter quatro “bondosos homens” e mais o professor dispostos a morrer por ela.
# Essa imagem de mulher idealizada fica mais evidente quando:
# a) as noivas de Drácula aparecem para tentá-la, dizendo sedutoramente “Venha conosco, irmã!”. O horror e a perplexidade dela são maiores que tudo, apesar de, nesse momento, Mina já estar sofrendo de vários “sintomas típicos” do vampirismo.
# b) o prof. Van Helsing vai exterminar as noivas de Drácula, ele sente toda a sedução delas, seu encanto e sex-appeal. Só consegue terminar a tarefa ao “ouvir” a voz de Mina, um apelo espiritual, mostrando que Mina é algo transcendente, que vai além mesmo dos apelos da carne. Nessa acepção, a moça pode mesmo representar pura e simplesmente o Amor em contraste com o Desejo.
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# Novamente, não nos é possível dizer se a intenção de Bram Stoker era, conscientemente, expressar as idéias acima quando escreveu sua história. Talvez ele simplesmente quisesse escrever uma história de terror. Mas é justamente essa antítese bem-mal presente na história que tanto atrai as pessoas até hoje: a despeito da crença ou não crença que uma pessoa apresente, esse tema muito dificilmente deixa alguém indiferente.
# Vencer as 587 páginas de “Drácula” não será, portanto, completamente vão a quem tiver, como Van Helsing, a mente aberta e despreconceituosa. Apesar da literatura de terror, assim como a policial, ser considerada “subliteratura”, pode-se refletir muito com a leitura desses livros, ou, na pior das hipóteses, pode-se esquecer os problemas por algum tempo e, ainda, ter-se uma mensagem de esperança.

# Para encerrar, algumas das melhores frases do livro:

# “Presumo que nós mulheres sejamos tão covardes que pensamos que um homem nos livrará de todos os nossos temores, e por isso nos casamos com ele.” Lucy

# “Por que não se permite que uma moça se case com três homens, ou com quantos a queiram, acabando assim com todo esse problema?” Lucy, após receber três comoventes pedidos de casamento e só aceitar um.

# “É que o trem deveria partir antes das oito da manhã. Este propósito, entretanto, não foi além da intenção, pois a despeito de minha correria para chegar à estação às sete e trinta, fiquei imobilizado em minha poltrona por mais de uma hora diante da plataforma de embarque até soar o sinal da partida. Parece-me aqui que quanto mais nos afastamos para leste mais aumenta a impontualidade dos comboios ferroviários. Nesta progressão, o que dizer desta pontualidade na China?” Jonathan Harker, em Klausenburgo, Romênia.